sexta-feira, agosto 03, 2012

No Campo... Real Fidalgia

Já lá vai um mês ou quasi que os dois encaixotaram os pertences no furgão do sr. Cotrim. Nesse dia a azafama foi grande e comprida a começar logo pela manhã a acabar quase ao por do sol.
Na rua defronte ao palacete a multidão de curiosos, uns cinco ou três pararam para ver o sobe e desce , entra e sai  dos carregadores. Durou talvez umas três horas o desfazer de de duas vidas de um par de anos.
Tudo acondicinonado, lá partiu a charrete para terras do Oeste. para o novo lar, a nova vida, as novas vivencias, as novas paisagens. Abadonaram Lisboa, não por obrigação mas também, não por gosto mas também. E com a casa às costas partiram, não para longe mas também.

O novo palacete, mais arejado onde o sol bate todas as manhãs à janela do quarto, espreita na cozinha e na grande sala de jantar a convidar para o pequeno almoço, ainda a embalar as almas adormecidas de uma noite bem dormida, está virado a sul, da janela da sala vê-se toda a propriedade, toda verde neste altura do ano, com vinhedos a correr encosta acima, árvores antigas a acolchoarem o vale onde corre a medo um ribeiro agora seco. Casario espalhado á esquerda e á direita, bem disfarçados entre os eucaliptos acompanham o vale, e no cimo de cada monte um moinho navega parado com as velas ao vento.
A montanha majestosa estende-se até ao vale, bate na encosta da casa e lá em cima no pico vê-se a Ermida da Sra. do Socorro onde em tempos alguns aventureiros atiravam-se de para pente e asa delta.

Logo pela manhã com o cantarolar da cotovia, o discurso do melro e o chamamento de um ou outro pardalito, tomam o pequeno almoço, uns dias no jardim sentados no banco de Cascais, onde de certo nobreza e fidalguia assentaram o rabiosque farto. Quando o tempo está mais encorpado com a nuvens que vêm a correr do Carvoeiro, sentam-se lá dentro na cozinha frente a frente a partilhar as torradas do pão saloio acabado de sair do forno de lenha.

Durante o dia, quando estão em casa, aproveitam para passear nas redondezas, ou refrescarem-se num dos três lagos, construidos para o efeito. A porta de casa raramente se fecha, e á volta os aldeões cumprimentam-se. O sol aquece todo aquele vale, que se refresca com uma brisa uns dias mais forte outros dias menos animada. Mas nos dias que o vento adormece, o bafo de calor só pode ser aturado nos lagos.

Quando o sol percorre todo o caminho e prepara-se para se recolher, todo o vale e a fachada se iluminam de cor de tijolo e no terraço fronteiro da sala tomam o seu Gin Tonico a saborear aquele momento. Ao longe vêm-se e ouvem-se as perdizes a depenicar o campo verde de relva, uma curuja das torres poisa no pinheiro bravo, enquanto os coelhos se entretêm com os rebentos frescos da relva acabada de regar.
Chega a noite e o casario ao longo do vale e das encostas ilumina-se, o moinho continua o seu caminho e os dois, recolhem-se para o jantar.

A lareira ainda não foi acesa, o tempo ainda não justifica, mas mais uns meses, na sala vai-se ouvir o repenicar das chamas nos tarolos secos. Um cheirnho a campo invade a casa cai a humidade e o aconchego dos sofás convida a um romanso depois do jantar, e antes da subida para os quartos.

Vive-se bem, sem pressa nem preocupação, não há buzinas, nem carros, á noite não se ouve o lixo, nem de manhã o autocarro. E quando se quer vir á cidade, ela está ali ao lado.

Que mais se quer?

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