domingo, abril 16, 2006

Cantos de mil encantos

Vim acabadinho de chegar, aproveitando o feriado religioso da Páscoa e do seu sempre desejado fim-de-semana comprido para todos aqueles como eu podermos descansar durante este tempo dos afazeres terrenos, superficiais e stressantes da nossa vidinha curta estúpida e vazia.

Aproveitando o fim de semana prolongado e sem vontade nenhuma, porque os prazeres alfacinhas se me assaltavam vivamente aos ouvidos, resolvi meter-me á estrada e buscar um pouco de paz de alma, e retemperar as forças no meu cantinho preferido deste cantinho á beira mar prantado…

Subi então á terra das minhas infâncias, aos cheiros da minha juventude, ás vistas das minhas memórias ás matas das minhas raízes. Ali cheguei com saudades da capital, das noites das boémias e das fanfarronices de que ultimamente me tenho avidamente envolvido. Queria paz, sossego e retemperamentos.

Em dois dias deu para tudo, ou quase tudo. Foi um recomeço, um re-nascimento. Curto é certo mas melhor que nada.
Em dois dias consegui outra vez re-encontrar aquilo que eu já tinha, mas que estava tapado por noites e noites de folia tresloucada mas sã.

Parece ter sido pouco tempo, dois dias não dá para muito. Mas dois intensos dias conseguem muito…
Redescobri outra vez os cheiros do buxo, os sons da água na fonte durante todo o dia e toda a noite. Ouvi outra vez o galo a acordar o sol os pássaros a cantar ao dia. O perdigão a chamar as fêmeas, os cães a ladrar aos estranhos.
Consegui sentir outra vez aquele cheiro das gardénias, do aqueduto, das pedras de granito no calor da lareira acesa. Do soalho encerado, mil vezes pisado por mim e agora mais mil vezes pisado pelos netos.

Vi de novo os cavalos as cabras os bezerros e os potros a pastar nos campos, agora verdes de primavera. Ouvi o pica-pau a chamar pelo cuco, o cuco pelo chapim ,e o chapim pela chuva, que caiu copiosamente durante todo o fim de semana.

Ouvi o abade a transportar a cruz a abençoar a casa e a família que ainda nela se recolhe. Os cânticos ao Salvador, que acabara de ressuscitar.

Deu-me tempo para pensar para chorar e para abrir os olhos para olhar em frente. Sou eu outra vez. Sou eu que preciso daquele canto como pão para a boca. Sou eu de que preciso das folias endiabradas de Lisboa e arredores. Das noites loucas, tresmalhadas. Dos sonos soltos silenciosos com a fonte a cantar.

Preciso de tudo, de tudo um pouco para poder seguir em frente e ir-me esvaziando no dia a dia.

Não mudava nada do que tenho agora, melhorava um bocado, afinava outro tanto, mas não acrescentava muito mais. Tirava até quem sabe…

Tenho tudo naquele canto, tenho outro tanto no meio do mar, as tardes doiradas noutro canto, sociedade com a lua,

de quê que me posso queixar?

1 comentário:

Anónimo disse...

Que belas Páscoas ó Cascas!
Até fiquei com saudades outras Páscoas da minha "enfoncia", e agora já sei, se tiver tambem saudades da pedrafurada, venho aqui, e é como ir lá. tavas inspirado.
J