Naquela casa bem no fundo do corredor, bem junto ao canto tínhamos a caldeira das águas para os banhos.
Com casa cheia acendia-se de manhã e ao fim da tarde.
De manhã para os mais velhos, à tarde para os mais novos e outros mais mandrioes.
A operação começava uma hora antes, com todo um necessário ritual. Primeiro limpar as cinzas, sim!! A caldeira era a lenha. Era em ferro fundido, vinha da Figueira da Foz.
Depois de limpas, bastava uma pinha e duas canhota até começarem a arder bem. A seguir juntavam se mais duas e estava a bombar.
Vem agora a parte mais importante. Abrir a água para encher o depósito e adivinhar quando estava cheio... Ouvíamos a água no depósito, batiamos para ouvir o toc toc e adivinhavamos se estaria cheia. Muitas vezes esperávamos a água transbordar. E aí fechavamos a torneira.
Quando começava a azáfama dos banhos, as regras eram simples, por a água na tina, ou encher o banho, o como dizem agora... Encher a banheira.. Por duas canhota na caldeira e abrir a torneira da água da caldeira, para ir repondo a água quente gasta no banho.... E que quente ela vinha!!!
Assim sucessivamente tomavamos os banhos à vez.
Só que constantemente, o raio da caldeira transbordava e a água escorria pelo chão da casa de banho a encharcar tudo.
Quando lá estávamos, era uma saída rápida da tina (banheira no actual). e fechavamos a torneira.
O pior era quando ninguém lá estava.... E muitas vezes acontecia....
Volta não volta quando alguém ia ao Lopes (casa banho prós I incultos...) ouviam se os gritos...
Ai a caldeira!! ai a caldeira!!!
Já sabíamos... Correria certa pelo corredor a fora para limpar a inundação....
Cansado de tanta correria e inundações, o Sr. Cardoso (Tio João para os sobrinhos). Engenhocas como era, electrificou a caldeira.
Assim sempre que a água enchia o depósito, a bóia de nível, ligada a uma campainha, quando chegava ao cimo fazia contacto e desatava a tocar triiimmm trrimmm trrimmm, tal qual um alarme.
Acabaram as inundações. Chegou o progresso, mas a engenhoca funcionou durante muitos anos e bons.
A caldeira eléctrica teve a sua vida, mas como o tempo segue e o progresso chega, acabou esquecida e desativada quando se instalou um motor e um esquentador.
Do sr. Cardoso, esse também o tempo o levou para perto do Senhor. Não acabou esquecido, antes pelo contrário. E muitas engenhocas ainda andam por aí a funcionar. Umas em casas outras poços, outras em canos, outras em barcos e em bancos. Mas principalmente, muitas nos nossos corações.