quinta-feira, setembro 26, 2013

Vindima do 4Vs QPF

A data já tinha sido marcada, há uns dias, era preciso Vindimar!! Já se viam alguns cachos a medronhar e não havia muito mais tempo a esperar. Pelo aspecto das videiras, tudo indicava que a colheita ia ser farta e boa. O calor dos últimos dias de certeza que já andava a marcar passo para fazer estragos era urgente ir às uvas.
Reuniram-se as gentes, os escadotes os cestos as tesouras. Na ultima semana lavou-se o lagar que guardara os pós, as folhas e teias do ultimo Verão, da ultima vindima.
Mais uma, ao fim de 84 Anos. Mais uma igual a muitas, mais uma na nossa casa.
O que aí vinha da vinha era vinho, verde tinto, cada vez mais raro nestes tempos de igualdade e de viragens ao Branco. Aqui, não fugindo ao passado. Só dá Tinto. E tinto do Bom. feito como antigamente, sem muitas mas com algumas mudanças.
Já não se ouvem os gritos de Torna! Torna! nem se vê as raparigas a colher os cestos para as cestas. O plástico entrou. Não estragou, mas ainda estranha. Não é bem a mesma coisa, mas ainda é muita coisa!!. Os escadotes que eram ás dezenas, passaram a ser menos, substituídos pelo atrelado do tractor que passa por baixo das ramadas, essas sim as mesmas com as mesmas vinhas de anos.
Empoleirados no atrelado, 5 homens assobiando modinhas vão colhendo os cachos para os baldes-cestos. à ordem avança o condutor mais uns metros e volta-se a colher cachos. o que demorava uma manhã demora uma hora, e o lagar a receber os cachos já passados pelo ralador, agora eléctrico, vai enchendo.
Começou-se logo de manhã, ainda o sol batia na Penha, lá longe. e o calor ainda não tinha subido da terra empoeirada de tantos dias de sol escaldante.
Os Homens lá saíram portão a fora a caminho da vinha nova, essa já desramada e posta em esteiros ao longo dos dois campos de cima da casa ( vergonha minha não sei como se chamam...desculpem a ignorância). E que bonita estava a Vinha!! Cachos grandes, cheios, bem postos.As grandes folhas da videira a dar sombra ao Sol. Começaram lá no fundo, perto da mata por onde em tempos se entrava na Quinta. O Buxo ainda lá está a dar aquele cheiro carecteristico. os dois marcos da estrema marcam ainda a entrada.
Mas antes de tudo. Uma malga de vinho e um brinde a uma boa vindima!. Começa a empresa.
Entretanto as mulheres, voltam a casa e seguem para a cozinha. Toca a tratar do repasto.  Eles irão aparecer sujos, suados, esfomeados, e principalmente com muita sede, que na vinha só se bebe água, por há que repor os níveis.
Sorriso a condizer com a cara arredondada, toda ela arredondada D. Rosa entretém-se nos tachos. verifica os temperos, refresca o vinho, acrescenta água no arroz. Está calor naquela cozinha de traves escurecidas de anos de petiscos e Invernos de fumeiro. Porta e janela aberta para o ar passar, mas nem uma brisa, nem uma folha mexe. O Calor aperta, abafa tudo, o ar está quieto, não mexe.  E o repasto lá vai ficando pronto. Desta vez foi uma coisa mais levezinha... Arroz de Pica-no-Chão.... comparado com a feijoada do ano anterior.....
Cá fora o ar traz um cheiro a lenha queimada. É o flagelo de todos os anos de todos o dias durante meses. desta vez contámos naquele dia pelo menos quatro. Quatro colunas de fumo a subirem direito bem alto e depois a espalharem-se pelos lados das Taipas e Povoa Lanhoso e outros na direcção de Guimarães e Vizela.
Depois de muitas idas e vindas , de muitos avanços pelas ramadas, de muitos litros de água bebidos, de ombros cansados o lagar encheu-se. Estamos ainda a meia hora da meia hora. E já se fazem previsões. Muito e do Bom. Este anos temos vinho à séria!
Na adega, escura e fresca abrigada por quatro grandes paredes de granito, com duas janelas suficientes para entrar a luz, ajudada por duas lâmpadas, tudo está pronto. Os pipos ainda lá estão, mas vazios e velhos. Desde há uns anos que já não são usados. Agora há as cubas de Inox. a brilhar, contentes de receberem mais uma colheita do 4Vs da QPF.
Aproxima-se a hora do Almoço.  Pousam-se os cestos e os baldes, lavam-se os braços refresca-se a cabeça na fonte onde a água corre fresca também desde a mesma altura que as vinhas foram plantadas.
Alguns mudam a camisa.  Esta tudo pronto para o almoço. Só esperam o Sr. da Casa, que passou com eles toda a manhã na vinha, no lagar, na cozinha, um bocado por todo o lado com eles, como eles sem cerimónias, mas com respeito e admiração de muitos.
Sem o Sr. da casa não se almoça, não se senta à mesa. E esperam.
A Familia tinha chegado de vespera, o Sr. da Casa, o filho e uns amigos prontos a ajudar e a fazer parte da festa. Não só da festa da Vindima, mas também do fim de semana.
Mais tarde chegou o ultimo casal desta alegre companhia. Era tarde foram deitar-se directos para no dia seguinte manhã cedo juntarem-se todos para a Vindima....mas começou cedo demais e só apareceram a meio da manhã, já o lagar estava meio cheio. Ficaram incumbidos de tratar do almoço não dos vindimateiros mas da familia e amigos.
O Sr. da casa entretanto lá apareceu para o almoço com a companha toda das vindimas. Arroz de Pica no Chão , ainda ontem picavam no chão ali ao lado do alpendre da cozinha de fora. Junto com o seu harém de cocorocós....hoje já tava no tacho, grande, de barro a fumegar.
Na casa principal, depois de se ter ido buscar a bela da vitela estufada com macarrão, aberto duas três quatro ou mais garrafas de vinho maduro, pois os convivas são de habitos e o Verde Tinto ainda lhes dá maleitas nas entranhas.
No terraço, á sombra, debaixo da buganvilia, afastados do calor lá se sentaram os convivas, separados dos vindimadores. Não por conforto, mas por ser mais agradavel aos vindimadores para estarem mais à vontade, sem cerimónias com estranhos.
No alpendre o Pica no Chão, já picava nos pratos de cada um, o Sr. da Casa sentado à cabeceira, mouco da idade, alegre do convivio, feliz pelo dia , alto falava, ria e todos se deliciavam com o arroz da Rosa.
Ao fim de duas de branco alentejano, passaram os amigos para um tinto do douro, bom e agradavel. terminou-se com uma aguardente vinica Perfurada, de calibre superior a muitas que por aí andam...
No Alpendre os homens seguiram á tasquinha da Irene, beber o café o bagaço e fumar os cigarros. Voltaram mais alegres e satisfeitos, e seguiram todos para a adega onde o lagar os esperava já carregadinho de uvas prontas a serem pisadas.
Sapatos tirados, calças arregaçadas, pés lavados, entra primeiro o mestre, o sr. Pinheiro, depois um a um sobem pela rampa de madeira e entram devagar no lagar.
Os convivas da familia seguem-se, copiam o ritual e entranham-se no mosto e começam todos ao mesmo ritmo a pisa. Duas horas, prevê o mestre, que organiza-os todos dentro do lagar.
-Começai daqui para ali, devagar, esquerda direita como se tivesseis a marchar mas debagár!! para não azedar o vinho.

Em roda à volta do lagar depois mudamos de sentido. É para pisar não é para esmagar!!!
A concertina aparece, e ao seu lado o cantor, modinhas de cá, modinhas de lá um maço de cigarros a passar junto com o tabuleiro das bolachas e claro, sempre!! Um belo espumante fresquinho para não se passar sede. Água é que não... tá lá em baixo nos alguidares para lavar os pés.

Em hora e meia, o mestre manda parar. Tá pisado, tá com cor tá com corpo. Agora vamos esperar, deixar fermentar e daqui a três ou quatro dias é passar para as cuba novas de Inox.
Um a um saimos do lagar, lavamos os pés e toca a fechar a adega e deixar o mosto em silencia á merce dos deuses e Anjos, para que todo o trabalho traga frutos.

É assim que nasce o Vinho Verde das Vinhas Velhas da Quinta de Perfurada. Ou 4Vs da QPF
84ª Vindima. Para o ano a data é redonda e tem de ser mais comemorada.