terça-feira, março 19, 2013
A Morte do Conde de Arnoso
Transcrição do diário da nossa Bisavó Matilde sobre os últimos dias do nosso Bisavô Bernardo, feita pela minha Mãe.
BERNARDO
21-5-911
Para os meus queridos Filhos.
Não esqueçam nunca a Santa Morte do seu Pae
Pindella
21 de Maio 1911
A Mãe
Os primeiros symptomas da sua doença manifestaram-se no Mez de Fevereiro – 1911. Os diversos desgostos porque desde – 1906 tinha passado, morte do João, morte de El-Rei D.Carlos, os tristes acontecimentos dos últimos annos da Monarquia todo o sobrehumano esforço quer para A salvar, para rehabilitar a memória do seu querido Rei. Amigo, elle, insulado,e único, empregara em pôr fim um desgraçado desfalque na sua fortuna, por um homem que atraiçoou a sua confiança, tudo isto a pouco e pouco o foi esgotando, a sua sensibilidade verdadeiramente extraordinária ficou profundamente ferida.
De num dia para o outro apareceram symptomas que alertaram os médicos e aquela constituição tão robusta e bella começou a abalar-se com uma rapidez extraordinária. Feita a primeira anályse do seu estado no dia 24 de Março foi desde logo considerado perdido.
Partimos de Cascaes para Pindella no di 10 de Abril.
Alli, pela alegria de se ver entre os seus, na Casa que tanto amava, tendo nos primeiros dias umas ligeiras melhoras, tão ligeiras que eu nem cheguei a alegrar-me! Tinha sempre no ouvido e no coração cruéis palavras que no dia 5 de Abril ouvira da bocca do nosso médico e amigo, que com muita razão entendeu dever dizer-me toda a verdade. Nunca elle se enganara com doente algum da nossa família e desgraçadamente os seus prognósticos foram sempre acertados.
Não me restavam ilusões.
Esperança em Deus nunca a perdi porém. Pois sabia bem que Deus poderia fazer o milagre. Não o quiz porém que a Sua Divina vontade seja feita!
Começou então o seu e o nosso Calvário.
A fraqueza augmentava dia a dia, a vista fugira apressadamente e a tristeza crescia com a convicção cada dia mais arreigada do que o seu fim se aproximava.
Mas resignou-se, como quem tem soffrido muito e, que pela sua fé, vê na morte o princípio de uma melhor vida. Referia-se à sua morte sem amargura, sem desespero, com um socego enorme.
Até ao dia 7 de Maio poude todos os dias dar o seu pequeno passeio no jardim, mas em toda a sua maneira de ser, se notava uma grande differença. Na Capella da Casa fazia-se o Mês de Maria a que elle assistia sempre, todas as manhãs ia à Capella fazer as suas orações, mas depois de algum tempo o seu mau estar era tal que elle dizia: “já nem posso rezar”.
No Domingo 7 foi um péssimo dia. Esteve, vindo de Lisboa o Eduardo Burnay e da vizinhança dois amigos mas o seu soffrimento era bem visível. Durante essa semana augmentaram as agitações a ponto de na quinta feira 11 pedir elle próprio ao médico que lhe desse um narcótico, cousa que elle nunca consentira em tomar, levantando-se de noite muito agitado, tinha excitações tão grandes que eu receava
elle fizesse alguma loucura.
Os diversos calmantes que elle exprimentou só lhe faziam peor. Era afflictivo. Durante essa semana vieram a Pindella ve-lo vários amigos entre elles o Luiz de Magalhães e o Alberto de Oliveira, mas nenhum teve a impressão de que o fim estava próximo. Só eu que me não illudia e como o não largava nem uns instantes e o conhecia bem, via os terríveis progressos da doença. Elle de vez em quando tinha uma esperança, mas logo a perdia. “Como isto é lindo” dizia elle olhando tristemente para as árvores, o jardim, o lindo céu azul todo illuminádo de sol” “parece já o princípio da Glória”. Em Cascaes ao partir tinha ido ao correio despedir-se dos empregados que tantos annos conhecia e disse-lhes “Adeus rapazes, nunca mais cá volto” o mesmo disse ao creado Joaquim.
Foi a pouco e pouco desinteressando-se de tudo como quem já não é deste Mundo.
D’uma meiguice enorme comigo e querendo-me sempre ao seu lado, beyjando-me sempre com tanta ternura! No Domingo 14 levantou-se muito mal disposto mas com a chegada inesperada do Vicente, que elle reclamava sem cessar, alegrou-se muito e passou o dia bem, conversando com vários amigos que de Braga e de Lisboa tinham vindo. Não foi porém néssa tarde ao Mês de Maria – elle e eu sós na sala da torre, fronteira à Capella, ouvíamos as vozes que cantávam e que no meu coração echoavam tão tristemente!
Na Segunda Feira 15 Veio o Carlos Ferreira como era a primeira vez que este vinha a Pindella, quis mostrar-lhe a casa e com elle andou por toda a parte, mas cansando-se bastante! Terça Feira foi ainda até à horta. À noite na sala cheio de tristeza com os seus sofrimentos que ouvia ler dizia:”É isto que eu agora estou a pagar”
Quarta Feira annos da sua afilhada Gracia, não quis levantar-se, sentia-se mto fraco, nto mal disposto. A noite tinha sido medonha de agitações e allucinações. Pelas 3 horas porém, lelvantou-se e n’um grande mau estar foi até à varanda aonde nesse instante se sentou mas logo quis ir para a sala, por sentir mto frio.
Alli passou o resto da tarde n’um grande desassocego, com uns movimentos de louco que mto impressionavam. Não podia parar quieto, tudo o incomodava. Durante o nosso jantar, a todo o momento entrava na sala, receando estar só, ter qualquer cousa O médico assegurava que tudo eram nervos, que o novo narcótico que trazia lhe daria uma boa noite de sonno. Nervos! Chegou esse momento. Tomou com grande repugnância o remédio – adormeceu.
De tarde na sala tinha chegado às 3 janellas que deitam para differentes lados e com a mão fizera o gesto de “Adeus” e voltando-se para o velho creado António disse “Já me despedi de tudo”
O médico a pedido meu ficara no corredor do nosso quarto, para assistir aos terríveis attaques de alucinação que todas as noites o affligiam e que ninguém comprehendia nem explicava. Deitei-me também mas hora e meia depois acordava com o meu Bernardo a levantar-se de um ímpeto dirigindo-se como louco para a janela. Gritei “Bernardo” elle voltou para traz e caiu de bruços meio deitado na
Cama banhado em sangue. Com o barulho a Anna apareceu e veio ver o que era. Eu já a pé gritei-lhe que me trouxesse o médico. Este veio, deitámos o Bernardo, mas logo a seguir elle tornou-se a levantar com uma força hercúlea, empurrando o médico, gritando que o deixassem. Estava fora de si. Logo porém reconheceu a sua impaciência, pediu perdão ao médico e serenamente se tornou a deitar. Mas… pouco durou. Recomeçaram as afflicções, não socegou. Na cama nada o retinha. Vieram todos, então percebi que o momento era grave.. Minha cunhada veio perguntar-me se eu queria um padre! Era então certo! Corri ao médico que tinha deixado o quarto e pedi-lhe que me disséce com toda a franqueza se era grave “gravíssimo” Bastou-me. Agora era preciso pensar na alma, essa sim tão bella e que eu tanto adorava. Mas nada receei! Conhecia de sobra a sua fé em Deus agradar-me-hia. Com o coração despedaçado fui para elle e, como dias antes lhe dissera começaríamos uma Novena de Comunhões por sua intenção e elle me tinha dito que desejava associar-se a ella, foi esse o pretexto que tomei.
Elle nunca se tinha recusado a Cumprir esses Sagrados Deveres … ainda, já mto doente, antes de deixarmos Cascaes, tinha com enorme sacrifício phisico ido receber o Nosso Senhor. Disse-me portanto, que tinha chegado o dia de começar-mos a Novena e que o Padre tinha vindo de madrugada para dar prazer à Mãe e que visto elle me ter dito que tomara parte na Novena – estar agora acordado talvez quizésse ser elle o primeiro. Não se iludiu mas não se espantou, recebeu esta ordem com a maior tranquilidade, sabendo perfeitamente do que se tratava e respondeu logo:”Sim tudo o que tu queres”
Durante esse momento de calma confessou-se e eu cá fora de joelhos contra a porta com as mão sobre o coração para comprimir os meus pecados, pois parecia-me que elle estorava, ouvia de vez em quando: “Não, não tenho” E não tinha com certeza quasi pecados, elle que era tão bom. Quando o Padre sahiu e eu voltei para o pé d’elle disse-me: “ainda bem que me confessei, agora quero receber o Nosso Pae, quero a Extrema Unção, quero tudo”
Com a certeza que lhe démos e que nada lhe faltaria, sossegou e adormeceu. Quando acordou e soube que principiava a Missa na Capella recomeçou desossegadamente a pedir a Santa Comunhão.
Veio enfim e com toda a solenidade. Adeante o João Affonso com o grande Chisto, o Padre com o Santo Sacramento debaixo da Umbella e a seguir toda a família, todos os creados. Não esqueço nunca mais semelhante comovente Comunhão Elle na sua grande cama com a voz mto fraca nessa manhã mto abatido disse: “Vêem todos! Até os creados, obrigada meus Irmãos” Peço perdão a todos,a todos perdou as injustiças que lhe fizeram, perdou à Família toda que foi tão injusta com migo” recebeu o Senhor no seu querido coração repetiu com nosco as orações, recebeu a Santa Unção, agradeceu a todos. A pobre Mãe veio dar-lhe um beijo e elle disse-lhe “Minha Mãezinha o teu filho vae morrer” Não morre não meu filho, mas se morrer vae para o Céu “vou e estimo muito”
Como dá Deus força assim aos que n’Elle confiam! Com que serenidade – com que paz veêem vir a morte aquelles que crêem na Vida Eterna e que deixam nesse Mundo as tristezas para uma felicidade sem egual. Elle que foi neste Mundo tão festejado, que ocupou uma tão linda situação, que teve todo o goso e prazer que um homem póde ambicionar, deixou tudo, sem uma queixa, sem uma lágrima, forças encontrou na sua fé, e na sua paz da sua consciência nessa confiança enorme na terrível viagem. Felizes esse todos. É numa fé assim que eu espero conservar e espero ver nos meus filhos.
Depois dos seus deveres tão cuidadósamente cumpridos socegou e adormeceu, sem contudo que o médico deixasse de ter as mesmas inquietações e que o seu estado conservasse a mesma gravidade. Telegraphámos para toda a família dando parte do tristíssimo estado do meu Bernardo e todo o meu desejo foi conseguir que o nosso filho que estava em Inglaterra viesse receber a última Bênção do tão bom, tão excepcional Pae
O dia de quinta feira 18 foi bastante afflictivo, d’esse grande mau estar e desassocego repetidas vezes dizia como se sentia feliz por ter recebido a Deus no seu coração, por estar tão bem preparado, que não receava morrer, só tinha pena de todos. Chamava mto pelo irmão e dizia-lhe ternamente adeus e virando-se para a Amália, repetia vezes nesses últimos dias:”Amália sou muito seu amigo e custa-me tanto vir aqui para lhe dar este trabalho e desgosto”. Falou com todos os filhos dizendo-lhes e a mim:”sejam sempre mto amigos e unidos como até aqui”
Ao Dr Delphim que foi chamado da Villa e que lhe disse ao chegar:”Então Senhor Dr. Isto o que é? Vamos a tratar de o pôr bom” este respondeu: “Não Doutor não põe, eu vou morrer, mas não tenho medo da morte, já recebi o Senhor e a Estrema Unção e morro com a consciência de ter sempre cumprido o meu dever” o João Afonso veio despedir-se por ter de voltar para Braga para as aulas e lhe disse elle :”Sê sempre muito bom, muito respeitador do teu Pae, que é um grande homem de bem” Adeus meu filho, não me tornas a ver”. A noite foi horrível de sofrimento. Vieram os sobrinhos de Braga que lhe quis ver e pediu perdão à mulher do Sebastião de Lencastre dizendo-lhe elle: “Adeus vou morrer, dá me um beijo e perdoa-me todo o mal que te fiz (referia-se à grande oposição que fizera ao seu casamento com o João) e diz à tua mãe que sempre a respeitei muito”.
Pelas 3 da manhã começou em grande ansiedade pela chegada do Lencastre que esperava n’essa manhã às 10 horas; a todo o momento perguntava as horas e quanto tempo faltava para elle chegar, dizendo sempre: “dizem que só se morre de madrugada, já o Lencastre não vem a tempo”! Chegou porém; elle teve muita alegria em o ver, animou-se com elle, queria-o sempre ao pé de si, mas logo que elle partiu ficou como se já não esperasse nada mais do Mundo! Não mais se referiu ao Lencastre nem à sua promessa de o vir buscar na segunda feira seguinte. Soffreu todo o dia, mas com resignação!
Minha Mãe, o seu grande amigo Themudo quer vir e dar-lhe o último adeus, todos estavam impressionadíssimos. Ao Themudo disse: “Themudo o teu amigo vae morrer vaes ficar só” Agradeceu mto a minha Mãe ter vindo dizer-lhe :”sou mto mto seu amigo. A noite passou-a com essas enormes afflicções, sem ter posição na cama, sempre a levantar-se. Mas sempre com a mesma serenidade e resignação só lamentando não ter “morrido hontem, que eu estava tão bem preparado”.
A Thereza Bretiando trouxe de Braga a Virgem Milagrosa da “Senhora da Torre” dizendo que talvez Ella fizesse o Milagre. Elle pegou na Virgem e disse: “Talvez mas eu soffro muito e era tão bom ter morrido hontem..” de madrugada estando eu estendida sobre a cama de estafada que me sentia adormeci, mas acordei sentindo o debruçado sobre mim, a pedir-me um beijo e meu irmão fez-me levantar pois os médicos sentiam que o pulso falhava e julgavam era chegado o momento. Como de costume pedi-lhe que rezasse com migo o que elle fez sempre da melhor vontade até ao fim. Vieram todos e elle vendo-os à roda da sua cama nem. se impressionava. A todos dizia numa ternura, para todos olhava com uma expressão tão doce. Durante bastante tempo, pensei que a vida lhe fugia. No jardim, ao raiar d’aurora um melro todos os dias nos acordava com o seu cantar tão bello e o Bernardo todos os dias que durou o seu martyrio, tinha uma grande anciedade por ouvir este signal do dia e perguntava mtas vezes se o melro ainda não tinha cantado, tinha sempre a ideia de que morria pela madrugada e desejava mto ouvir o melro.
O melro cantou e elle socegou. Voltou a si, foi-se reanimando e os médicos tornaram a dizer que ainda não seria então. Que robusta constituição a sua! Sim as vezes que o julgavam a morrer! O dia de sábbado foi medonho. Enfraquecia a olhos vistos, mas sofria tanto que não podia estar socegado um momento. Da cama para o sofá e outra vez para a cama, assim passou o dia.
Grandes coágulos de sangue tapavam a respiração e que os expelia com uma difficuldade enorme.
O pulso falhava constantemente e o Eduardo Burnnay que tinha chegado querendo-lhe dar uma injecção de canphora. Quis porém vestir-se e ainda acompanhado foi até à janella mas para logo voltar para a cama e assim se passou o dia de sábbado repetindo nos a todos mtas ternuras, mtos conselhos, gemendo a todo o instante. Ver o “meu irmão que tanto adoro”.
O Vasco e Bertha chegaram também o que muito gostou dizendo lhes que dissessem aos Sabugosas que tanto sentia não os tornar a ver. À Mãe “Mãezinha, custa-me tanto, dar-te este desgosto, voltava-se para mim devez em quando a pedir beijos e dizia “Sou muito teu amigo, vaes ficar viúva”! E repetia-nos mtas vezez a saudade que tinha de nos deixar. Chegou a noite e pelas 11 horas nova crise mais longa ainda do que as outras. Durante horas todos no quarto esperávamos o ultimo suspiro.
Vieram os Padres, recebeu os Escapulários de Nossa Senhora do Carmo que beijou ternamente dizendo-me que queria tudo o que eu quizésse, recebeu as últimas Bênçãos. Rezaram-se as orações da Agonia e elle deitado sobre o lado direito parecia acabar a todo o instante. Eu de pé ao seu lado nem respirava, e de repente, tendo em frente de mim a Imagem da Senhora da Torre toda iluminada, pedi-lhe com extraordinário fervor: “Nossa Senhora da Torre, fazei o Milagre” e logo elle abriu o olhos e disse: “Como custa morrer meu Deus!” Estão todos aqui, vão-se deitar, deixem-me só, não se cansem por minha causa, leva tanto tempo a morrer!
Antes d’esta crise tinha pedido a todos os filhos e à Maria do Carmo disse : sê sempre mto boa, levo-te no meu coração, e voltando se para a Anna sê sempre boa para a tua irmã” Falando-lhe eu nos pequeninos e no nosso Bernardo, que estava fora disse tristemente:” e os pequeninos coitadinhos! Ao Bernardo nada tenho que lhe recomendar, só que seja mto bom rapaz, tudo lhe dizia sempre nas minhas cartas”.
Depois de ter voltado a si da grande crise agradeceu ao Pde. Joaquim que alli estava, tudo o que quer elle fizera repetindo e falando que não tinha medo de morrer, pois tinha sempre cumprido o seu dever.
Como o visse mais socegádo pedi a todos que sahissem, pois os médicos de novo reconheceram que o fatal momento ainda não tinha chegado e disse-lhe a elle: Vaes melhorar, Nossa Senhora da Torre vae fazer o Milagre” olhou-me com imensa ternura e disse: “julgas?” Tenho a certeza,vaes ver que estiveste mto afflicto, mas já estás melhor? “Sim, é verdade, ai se Deus quizer” (repetiu mtas outras vezes esta phrase d’ahí por deante). Com os alívios que sentiu, renasceu a esperança e chegou a ter desejos de se curar. Obrigaram-me a deitar-me um bocado ficando com elle o Eduardo Burnnay, a Anna, e a Maria d’Agonia que abraçava mtas vezes recomendando-nos a todos que nunca o abandonássemos, que nunca lhe faltasse nada.
Logo porém depois de me pegar no sonno, ellecomeçou a chamar por mim e e disse-me que com tal angústia:” A Matilde aonde está ella, chamem a minha Matilde”. Como quizéssem que eu descançasse disseram-lhe que eu dormia, que era melhor não me chamarem “Pois bem vou eu pelo meu pé buscá-la, que tem que eu a vá buscar, ella é a minha mulher”. Pediram para fazer-lhe a vontade e eu hoge deploro bem essas horas que passei longe d’elle . Exegiu que eu me estendesse sobre a cama a seu lado – dei-lhe mtos beijos. Começou então o dia de Domingo, o último d’esta vida, mas o dia da sua Glória! O soffrimento era menor custava-lhe porém mtº a engolir e isso dava-lhe a certeza de que a morte se avisinháva “É bem certo agora que morro, pois se não posso engolir, como posso viver?” O olhar embaciava-se, a voz enfraquecia, a boca um pouco ao lado transtornava-lhe a phisionomia. A voz entramelava-se, mas durante todo o dia começava o Padre Nosso, e a Ave Maria, ou “Dae-lhesSenhor”, nós acabávamos a oração o que mtº o alegrava. Rezou assim constantemente e beijava ternamente o Crucefixo e o Escapulário.
Uma vez voltou-se para mim e ajudado por nós disse (1):Os meus discursos quero que se publiquem.
Ao Bernardo quero que se lhe faça o smoking que elle desejava. Não vendas Tarrio conserva aquilo por causa da minha Mãe, para estarem todos juntos. “d’outra vez disse-me :”sou muito teu amigo, mas vão pedir ao Lencastre para me curar” O nosso Bernardo devia chegar nessa noite e os médicos faziam tudo para lhe prolongar a vida, mas elle fugia a passos largos. 6 horas da tarde, foi nesse dia lindíssimo com as janellas abertas sobre o campo todo em flor. Cheguei as roupas ao Bernardo – arranjando-lhe as almofadas disse-lhe:”Vae dormir um bocado, estas assim comodanente e vae fazer-te bem” “pois sim, talvez”. Nunca mais fallou! Sem mudar de posição, mais duas vezes abriu os olhos, sentindo alguém entrar no quarto, mas não teve mais momento algum consciente. Entrou no estado comatoso – durante 1 ½ horas assistimos ao apagar sereno e calmo d’aquella nobre alma. Ainda recebeu a Bênção Papal e às 7 e 40 do dia 21 de Maio, as mãos sobre as minhas, rodeado de todos os que amava excepto o nosso filho Bernardo, na Casa de seus Paes, como bem justo, n’esse silêncio e d’uma paz imensa deixou este Mundo, para outro melhor e eterno, o melhor dos homens, o mais belo, o mais dedicado aos amigos e o mais adorado dos maridos. Com elle se foi a minha felicidade,a alegria da minha alma. Está no Céu! Seja feita a vontade de Deus! E que a sua vida e a sua morte sirvam d’exemplo aos seus enternecidos filhos
(1) – “Olha que o meu enterro é d’aqui para a estação”
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